sábado, 31 de maio de 2014

in

Busco a essência,
busco o dia que todos nós nos reconheceremos como parte do mesmo todo.
Busco você, ele, todos nós,
Busco uma coisa só.
E espero que cheguemos lá.
Lá onde as aparências não enganam, porque elas nao existem
Lá onde a gente não precisa fingir ser feliz, a gente descobre que é
E que tem tudo que basta pra isso.

A verdade é que a gente ta perdido.
Só porque não procurou se encontrar por dentro
E enquanto isso não acontece, viveremos buscando o inatingível. Ou inexistente

sexta-feira, 23 de maio de 2014

be patient

São 00:29 de um sábado. Sim, fim de sexta, 29 minutos iniciais de um sábado chuvoso e eu decidi que entre as mil coisas que eu preciso fazer, não quero fazer nenhuma.
A madrugada tem um silêncio peculiar que contrasta com nossa mente sempre contra o real e a favor do imaginário. Sabe aquele caos mental que te impediria até de dormir por um tempo? Aquele que te tormenta todas as noites de dias conturbados positiva ou negativamente e te fazem rolar na cama se nao por minutos, por algumas horas, até que o cansaço geral vença. Então, é essa a bagunça que me acompanha e não, não me sinto solitária na madrugada. Muito menos, em silêncio.

A gente não percebe as vezes, mas o tempo passa. E muito rápido. Se você nao resolver prestar atenção em alguns pensamentos que passam pela nossa cabeça em dias melancólicos, terá perdido a chance de sentir o que anda perdendo ou ganhando por aí. Hoje em dia, a gente anda vivendo muito, várias vezes, por vários meios. Recebe muita informação, dá conta de várias coisas ao mesmo tempo e esquece o relógio ou só lembra dele. Deixamos tudo acumular, tudo virar o caos, para que no fim, possamos parecer ocupados demais, estressados demais, adultos demais. E aí, nesse meio todo, perdemos o principal. Perdemos a despedida, o reencontro, a reflexão, o aprendizado, a vida de um só.

Bom, o semestre está acabando e, com ele, mais um período da faculdade termina. Eu faço medicina, e, procurando outros textos por aqui, perceberá que é a realização de um sonho. Mas, como é natural, todo sonho que vira rotina, deixa de ser sonho para virar objetivo e,  por vezes, a gente esquece o que era.
Estou no terceiro ano da Faculdade e isso me dá um certo alívio e um certo medo também. As coisas já nao sao tão novas, não rola aquele desconhecimento de calouro, partes bem chatas já passaram e partes boas estão por vir. Por outro lado, partes essenciais já passaram, muita coisa boa já passou e a responsabilidade aumenta gradativamente. Eu percebi quando tive que mudar de postura. Quando saí da teoria pra prática e me vi conversando com as pessoas mais distintas possíveis, sobre suas doenças e, principalmente, sobre suas vidas. Eu senti que estava mudando e assim devia ser. Ainda estou, e talvez, escrever seja uma forma de continuar sentindo. Conversei, conversei, conversei. E passei a tocá-los. Agora, Dona Maria, eu posso, por favor, fazer o exame físico da senhora? É rapidinho, só pra ver o coração, pulmao? Seu Sebastião, fala 33! De novo! Repete! Seu João, tem alguma dor na barriga? Pedrinho, vira de costas pra mim, por favor? E aos poucos, a vergonha dá lugar a um pouco mais de segurança. E o medo, lugar a confiança. O que mais me impressiona para além das anomalias raras que a gente tem a chance de estudar, é o sorriso dos pacientes e o olhar. Eu me pergunto como pode sorrirem naquela situação? E ainda contarem pra gente sobre o que lhes é mais íntimo? Guardo comigo papéis com o número de filhos da dona Mara, com os hábitos do seu Francisco, com a casa da Dona Eulália, com a vida inteira de gente guerreira que ensina pra gente muito mais do que os livros. Guardo comigo o olhar verde e cheio de vida do seu Flávio, vida que o corpo já não demonstra tanto, mas o olhar serve como comunicação, expressão e significado. Guardo comigo a simpatia do seu Sebastião que deixou 8 pares de mão examiná-lo incansavelmente e a saudade de quando soubemos que ele não estava mais distribuindo sorrisos espontâneos pela Terra. Guardo comigo a seriedade de uns e o humor de tantos outros. Guardo a paciência de todos eles. Paciência essa que podia ser só título, mas virou admiração também. "Podemos examinar o senhor?" "Claro, a vontade". Admiro cada um deles que nos ensinaram e permitiram tudo isso. Obrigada. Espero ser como alguns deles disseram: Menina, vocês aprendem com a gente agora, para cuidarem da gente no futuro. Seja uma boa médica.
E eu saia com o coração cheio: se Deus quiser e Ele há de querer.
A medicina me revolta, me estressa, me enlouquece, mas me apaixona. É daqueles amores meio malucos que você sabe que haverão percalços, mas não vive sem. Aquele sentimento de pertencimento. A sensação de que é ali o seu lugar.
Os médicos também me admiram. Não porque já estão aonde quero chegar, mas porque tive contato com professores que sabiam muito além da técnica. Sabiam lidar com pessoas. Pasme. Assim como eu me surpreendi achando que uma universidade devia estar cheia de arrogantes intelectuais cientistas sem compaixao, me surpreendi. A faculdade tem nome pelos seus profissionais. Pelos seus bons profissionais. Disse o paciente que, mesmo com todos os problemas estruturais, o HU ainda era o melhor lugar pra ele estar. E as pessoas de lá eram boas. Os médicos, as enfermeiras, os técnicos.
Posso dizer com um certo orgulho, de que os professores com os quais tive contato até hoje, perguntaram o nome de cada paciente que conversamos. E foram incluídos nas conversas. Eles não são a insuficiencia hepática, o sopro, a turgencia, a hemossiredose, a ascite. Eles sao a Ana, o Paulo, a Jacira, o Antônio, a Mara, o Celso......

Assim, foi se passando meu período. E eu nem tinha me tocado. Deixei tudo bem acumulado e nessa última semana, to pensando que devia ter feito diferente, devia isso, devia aquilo. Quando percebi, já estava me despedindo. E deu tempo de parar pra pensar o que mesmo está acontecendo em meio a mil provas.
Ah, é. A medicina é realidade. Boa ou ruim. E entre as mil coisas que eu não quero fazer, está não perceber que as coisas mudam e a gente muda com cada uma delas.

domingo, 23 de março de 2014

de(stino)veria ser

 Andava despretensiosamente pelas ruas cheias de arvores quase verão. Dava um passo por vez e olhava pra frente, ouvia os carros, os pássaros e se ouvia. Pensava nela mesma e em como era bom estar ali, só ela e com ela

Ele, do outro lado da calçada, andava na mesma rua. Prestava mais atenção nela e em como ela andava, em como olhava o seu redor e nem percebia sua presença do outro lado.

Passou um carro, dois, três. E parou. Resolveu atravessar. Não para segui-la, mas pra ficar mais perto.

Ela percebeu. Olhou pra trás e despretensiosamente era só o que queria parecer. No fundo, buscava outros olhos para os quais prestaria mais atenção.

O Sol resolveu se por para aquarelar o céu. E eles pararam. Ela olhou pra trás. Ele pra frente. E por algum motivo ou por nenhum deles, perceberam o que já devia ser.

Mas nada é tão mágico assim. E voltaram a andar, um pouco mais perto, mas andaram.
E como devia ser, as mãos trombaram e se entrelaçaram.
Os pensamentos sintonizaram.
Os olhares cruzaram.
E o beijou expressou o que já devia ser. Há muito.

quarta-feira, 19 de março de 2014

vários deles

"Se você é medico, é porque considera a vida dos seus pacientes um pouquinho melhor que a sua".

É, talvez, seja isso. Eu que achava que a vida de todo mundo era igual, já nem acho mais. Acho a dos outros mais importante, e, principalmente, daqueles que foram acometidos por algum tipo de doença, de desvio do que é fisiológico, por algo fora da capacidade deles de resolverem. E, por isso e muitas outras coisas, confiam em pessoas até então desconhecidas, para abrir o que lhe é mais íntimo: o corpo, e possivelmente, a alma. Abrem suas histórias, suas vidas, seus medos e confiam, simplesmente. Fazem isso, devido a um diploma de 6 anos ou mais. E basta pra eles. É pouco, mas basta pra eles. O resto, vem com a confiança de que somos gente também e que entenderemos a mesma humanidade. Ou nem é isso.
Eles simplesmente se abrem sem pensar muito em nós. Nós, não médicos, nós que vestimos o jaleco e vamos ali, na beira do leito, enchê-los com perguntas. Me dei conta, de repente, que guardava os dados pessoais e histórias para além da doença de cada um que resolvia me ajudar. E que eles confiavam já, mesmo sem o diploma. Mesmo sem o conhecimento. Talvez porque o mundo não seja tão frio quanto parece e há nele pessoas. Pessoas. Não precisam de muito para confiar. Muito menos quando estão sofrendo. Se abrem na dor e contam sem rodeios, alguns até com sorrisos. E quem se perde com tanta confiança, é a gente ali do outro lado que sente uma vontade maluca de largar as formalidades, puxar a cadeira e bater um papo. Abrir a vida também e dizer: "olha só, somos parecidos, torço muito para que sua dor melhore e logo, faça tudo o que deseja!" E a gente aprende....Aprende que nossa vida tem muito valor e que cada minuto do dia é bem importante para mudar o rumo dos nossos caminhos. Aprende a valorizar quem está do nosso lado e quem não está também. Aprende que nosso corpo tem uma capacidade enorme de suportar muitas dores e, ao mesmo tempo, uma fragilidade enorme de suportar muitas dores. Aprende que não importa raça, sexo, genero, opção política, sexual ou religiosa, mas que o brilho nos olhos é o que mais diferencia cada um. Sei lá, mas eu acho lindo.

Hoje, sem muita explicação, me bateu uma tristeza e um desânimo bastante grande sobre a vida e tudo o que eu ando fazendo dela. Não quis fazer mais nada além de pensar. As vezes, a gente cai nessas de que deveria estar fazendo outra coisa. Deveria ter escolhido uma vida mais fácil, uma coisa mais leve, algo mais alegre. Podia chegar em casa mais cedo, não pegar tanto transito, não gastar tanto tempo estudando. Podia ter tempo pra dormir, sair com os amigos que tanto reclamam-com razao-que eu sumi. Podia ter uma rotina menos massacrante e mais leve. Podia tanto....A gente sempre pode muito, tem um milhão de caminhos e ao tomar uma decisão, sempre haverá os outros por que não. Sempre. E no meio do caminho, nos esquecemos o porque mesmo de estarmos nele. E não em outro que parece andar com mais tranquilidade e numa trilha mais bonita. Vale uma boa memória para se lembrar que deveria haver uma escolha e por algum motivo, você fez aquela. Pode não ser a mais bonita, a mais legal ou a mais tranquila, mas foi aquela que teve o bom motivo para escolhe-la.
O meu bom motivo eu relembro todos os dias quando um paciente sorri e diz "obrigado" mesmo que eu não tenha feito nada, além de incomodá-lo tentando aprender. Obrigada, queridos, por tanto, mesmo ainda sendo tão pouco.